Não sou muito dado á escrita mas quando o Filipe me convidou para relatar a minha experiência a solo no TeT Espanha, disse-lhe apenas que sim … sou um fácil 😊
Inspiração
Isto tudo começou porque tinha uns dias de férias para gastar do ano passado, a minha mulher já não tinha ferias e os filhos estavam na escola, eram 4 dias e meio de ferias que juntos a um fim de semana daria seis dias e meio. Comecei a pensar que track fazer mas depois de 5 lés a lés off road, 3 Nosso Dakar, Adventure days, ACT e mais uma serie de passeios decidi que iria fazer algo em Espanha. Pareceu-me bem o TeT, só faltava decidir se ia para sul com inicio em Rosal de la Frontera ou para norte e começava em Tourém. Com o tempo que tinha decidi ir para norte, meio dia para lá chegar e outro dia para voltar, dava 5 dias de offroad, algo que nunca tinha feito.
O Desafio
Pensei em convidar alguém mas a ideia era colocar-me à prova em algo novo e nada melhor que quase 7 dias a solo em offroad e 2500 kms. Todos me disseram que era maluco mas a minha teimosia levou a melhor. Para alem de fazer alguns passeios sozinho, o meu 1º lés a lés foi basicamente feito a solo e sem quase experiência em 2 rodas em offroad, portanto foi siga que para a frente é que é caminho.
A ideia era ir completamente livre, acordava quando queria, andava quando queria, comer quando queria, nem hotéis levava marcados. O objetivo era apenas curtir e chegar a Ponferrada ou a León sem me esbardalhar.
Para deixar a família mais confortável com a minha segurança comprei um localizador por satélite da Garmin, o Inreach, que dá para saber onde ando bem como possibilidade de pedir socorro em qualquer lugar. Adicionalmente fiz um seguro de aventura que cobriria os custos caso a coisa desse para o torto.
Estava empolgado embora no dia antes de partir tivesse alguma ansiedade … mas bastou sentar-me em cima da mota para aquilo desaparecer.
A bagagem era curta, alforges da Kriega, tail pack da Enduristan no rack traseiro e uma mochila.
O Plano
A seguir ao almoço da 2ª feira do dia 17 de Maio estava de partida. Passei pela loja da inparts em Santarém para comprar um “cruise control” da Oxford. 10€ que dá muito jeito quando se faz muito alcatrão.
O objetivo era ir dormir a Pitão das Junias, mas ainda passei pela loja da Thorkracing em Penafiel, serviço 5 estrelas sem poder deixar de falar da app desenvolvida por eles, Drivemodedashboard. Foi a app que mais usei e que gosto bastante.

Estágio

Lá cheguei a Pitão das Junias já de noite, meio enrregelado mas valeu a pena aquela viagem.
Estadia e jantar fabuloso na Casa do Preto onde comi o melhor bolo de chocolate até hoje. Os donos são uns excelentes anfitriões. Até tive oportunidade de conhecer um Francês que ali chegou á uns anos numa caravana para passar uns dias e ainda lá está.
Manhã cedo toca a levantar mas o tempo não convidava para andar de mota, para além de estar a chover estava muito nevoeiro. Pensei, já que aqui estou vou ali ás cascatas. Que ideia da treta que eu tive, andar aquilo tudo, descer e subir aqueles degraus todos feito astronauta a chover com o capacete na mão e todo vestido com o fato de chuva. Conclusão, nem tinha começado o TeT e já estava cansado mas valeu a pena ir ali ver a cascata a jorrar agua com fartura só para mim. Entretanto lembrei-me que Espanha era mais 1 hora, tinha que me pôr a andar, era quase meio dia em Espanha e eu ainda nem tinha começado.
Entretanto a chuva tinha desaparecido como previsto. Os astros estavam-se a alinhar.
TET Dia 1
O track não apresentou grandes dificuldades neste primeiro dia tirando apenas algumas situações onde nos temos que aplicar um pouco mais. As paisagens seram simplesmente soberbas.
Já passava das 6 da tarde e estava em Ourense apenas com umas barritas chocapick. Atestei a maquina, um donut e um redbull e fiquei como novo. Estava sozinho, o dia só terminava quase ás 10 da noite pelo que segui para a frente. Antes de Ribadavia parei no meio de um pinhal para marcar o hotel. Pesquisas no Booking e Google e rapidamente já tinha uma reserva: 40€ com jantar e pequeno almoço. Era um hotel de estação de serviço muito simpático e barato que é o que se precisava.
Eu e o meu Portunhol não conjugava bem com o Galego. Percebi isso ao tentar comprar óleo para a corrente da mota numa estação de serviço e o homem me querer vender 5 litros de óleo para corrente de moto serra 😊 portanto a técnica é falar Português com “espácio”. Percebem-nos melhor e somos mais bem recebidos.
TET Dia 2
Dia 2, nem é preciso despertador quando andamos nisto das motas. Rumo a norte aparecem alguns desafios nalgumas subidas onde tive que me empenhar mais. Muita pedra (grande) valas fundas e erva molhada. Tive que suar um bocado nalguns sítios e recordar-me sempre que estava sozinho. A estratégia era não me cansar em demasia para ir gerindo o meu esforço no decorrer da semana. Portanto quedas, andar a levantar a mota do chão e outros esforços era de evitar. E assim fiz, nenhuma ocorrência durante a semana. A estratégia: ir com tranquilidade e usar a cabeça quando é preciso. Não sou nenhum herói e o PDI ás vezes já me ataca.
Comida rápida em Pontevedra e siga para Santiago de Compostela onde não fazia conta de ir por já conhecer. A ideia era chegar a Finisterra. É impossível fazer algumas paragens para sacar umas chapas tal é a beleza e imensidão daquelas paisagens. A chegada a Finisterra ao final da tarde foi algo divinal.
Lavagem da mota que estava cheia de lama nos amortecedores e já não se via o laranja dos autocolantes. Arranjei hotel junto á praia baratíssimo e encontrei 5 motociclistas espanhois nas suas BMW´s a gastar as reformas. Ainda estive na palheta com eles, malta porreira muito admirados por andar ali sozinho no meio do mato.
No dia seguinte, imperdível não ir ao farol a poucos kms.
TET Dia 3
Logo no inicio da manhã apanho um single track de pedras em escada para me aplicar. Recordei-me então que andava a fazer o track ao contrario, o que geralmente a malta desce, eu andava a subir. Mas com calma e técnica lá se fez.

Até aqui nunca tinha encontrado ninguém no track, algo que iria mudar pois uma parte do track que passa a norte de Santiago de Compostela é os caminhos de Santiago. Encontrei peregrinos, alguns sozinhos. Os trilhos eram fabulosos.
Ao final da tarde paro eu numa aldeia para ver onde estava para marcar o hotel que seria em Portomarín. Fui abordado por filho fã e possuidor de uma Ktm, depois vem a mãe e estivemos ali á vontade uns 20 minutos de conversa. Não me fui embora sem antes tirar uma foto com eles.
Portomarín é muito bonito e pequeno, no hotel era só eu e outro casal. Por ser tarde, a dona lá me reservou jantar num restaurante de uma amiga antes que fecha-se, algo a que já estava habituada visto ser uma localidade de muita passagem de peregrinos.
Ia colocando umas historias no Facebook para quem me acompanha e saberem onde andava. À conta disso um amigo de infância que não via á muito tempo contacta-me através do Messenger a dizer que tinha passado pela zona onde ele estava. Eu sabia que ele estava em Espanha mas não sabia onde. Como já era parte combinamos em encontramo-nos ao pé de Lugo, onde ele trabalhava.
TET Dia 4
Para começar bem, roubei alguns kms ao track e lá fui, não ia deixar de perder esta oportunidade de o poder reencontrar.
Voltei ao track com algumas partes com bastante lama e erva molhada. Algumas vedações não identificadas no track levaram-me a perder algum tempo mas faz parte. O almoço nesse dia foi um bocadillo de torta francesa e uma coca cola para dar energia juntamente com a malta do café lá da terra. Havia sempre alguém com uma ktm de enduro para conhecer e alguma conversa 😊
O dia ia acabar em Ponferrada sem antes não apanhar uma subida para suar: regos cheios de pedras soltas e pontiagudas sem nenhuma visibilidade cheia de arbustos. Ainda andei ali a patinar um bocado mas lá me safei.
Hotel no centro da cidade e ainda deu para passear um pouco para ver a cidade e fazer uns arranques com os aspiradores da Glovo nos semáforos.
TET Dia 5
Ultimo dia, chegar a Leon. O corpo já acusava algum desgaste mas estava quase.
Algumas pistas rápidas no incio do dia e encontro uma parte do track um pouco desafiadora. O meu estado mental e físico não estavam virado para aquilo pelo que decidi arranjar uma alternativa. E ainda bem que o fiz. Alternativa fabulosa para rolar com muita curva e onde encontrei este spot fantástico. Estava eu a fumar o meu belo cigarro quando me aparece um senhor com o seu cajado que andava a fazer a sua caminhada. Meteu conversa e estivemos uns 30 minutos na palheta e onde aprendi que á alguns anos atrás viviam ali muitos Portugueses por causa das minas. Naquele local no dia 1 de Agosto faz-se ali uma festa. Todos levam comida e bebida e até há banda. Um gerador e boa disposição e está a festa feita. São pequenos momentos como este que fazem estas viagens ser um pouco diferentes e tudo isto porque estamos sozinhos.

A fauna e flora que se encontra na Galiza ou em Castilla e Léon e simplesmente fantástico. De vez em quando vinham aves que desciam e voavam á minha frente uns segundos e depois subiam, simplesmente brutal.
Algo que tive me controlar, foi em não parar em todo o sitio que seria fantástico para tirar uma foto.
O track passava a norte de Léon que era onde ia terminar no entanto a poucos kms do fim encontro uns enduristas espanhois, parei e cumprimentei-os em Espanhol … ninguém me respondeu. Achei estranho e disse que tinha vindo de Portugal, saltaram logo das motas para verificar a matricula e estavam muitos supresos por ter vindo naquele tipo de mota e ir para Lisboa. Sem combinar nada, arrancamos todos misturados e ainda andámos uns kms juntos.
Não podia fechar o TeT offroad da melhor forma. TOP
GPS até Léon onde tinha reservado um hotel barato no centro. Estava de coração cheio com o meu objectivo cumprido.
A noite nesta cidade é fabulosa com montes de gente na rua a comemorar a Vitoria do Atlético. Foi apenas nesta noite que senti alguma solidão, por um lado ainda bem que estava sozinho pois acompanhado tínhamos começado a desbravar bares por ali fora.
Regresso
Não me fui embora sem antes ir á Catedral logo ao inicio da manhã, umas das mais bonitas da Europa com os seus 1800 metros quadrados de vitrais.
Estava frio para andar de mota (3 graus) pelo que calcei 2 luvas e lá me meti ao caminho, eram quase 700 kms até casa. Pensei que iria ser uma viagem monótona sem nada para contar mas não foi bem assim. Deste a Cidade Rodrigo até casa foi sempre a levar porrada do vento. Mota leve em cima de viadutos era tramado, entrava numa faixa e quase saía na outra.
Encontrei motards de Minde na estação de serviço do Fundão e ainda tive na palheta com um feliz proprietário de uma T7 em Aveiras. Até casa foi sempre as rasgar, afinal queria ir jantar com a família.
Provavelmente a melhor viagem de mota que fiz até hoje pois quando andamos sozinhos todos os pormenores que nos rodeiam têm muito mais importância. Nunca tinha ouvido tantos animais na floresta como nestes dias.
Por onde passamos absorvemos muito mais tudo o que nos rodeia.
- Máquina: KTM 690 Enduro Rally 2019
- Pneu frente: Metzeller MC360 Mid\Hard
- Pneu tras: Dunlop 908 Rally Raid
- Capacete: Nexx XD1 com viseira e óculos
- Equipamento: Enduro integral com casaco Leatt, casaco e calças para a chuva
- Total kms percorridos: 2.500kms
- Total track percorrido: 1.350 kms

O Piloto | Elias Alves

Elias Alves @ktmfatherandson
Nascido em 1974, fã do todo o terreno começou pelos jipes, passou pelos quad e acabou nas 2 rodas. Anda regularmente com o seu filho, com amigos, passeios organizados ou a solo..
Fã das Ktm, gosta de pôr as mão nas suas motas.
Conhecer novos locais, novas pessoas e aceitar novos desafios são o que o impulsiona.
Mais fotos em https://youtu.be/2x3RXFuHvpk (nao se esqueçam de subscrever)